quinta-feira, 28 de setembro de 2017

corpo máquina

eu já me sujei com graxa muitas vezes para agora poder estar aqui deslizando pelo asfalto. pernas motor de impulso fazem meus pés girarem a 12 centímetros do chão. a engrenagem roda. a máquina nunca quer parar. homem máquina na sua mais perfeita sintonia simbiótica. ajustes finos a transformam na extensão de um corpo em movimento constante e sincronizado. coração bate forte. pernas queimam. o vento sopra.

passar por latas invólucros de vidros escuros que protegem seres que nunca se arriscam em sentir o vento. proteção a todo custo contra um sistema perigoso. eu não. eu deslizo pelo asfalto e o som do vento é a canção que me falta quando passo o dia inteiro dentro de caixotes de concreto a olhar para a tela luminosa que reflete uma realidade intangível. estática zona de conforto em forma de trabalho alienado.

mas continuo me sujando. e o corpo a sangrar é o preço que se paga por estar vivo e ainda desfrutar de alguma liberdade de escolha. não quero ser igual vocês. e quem nunca se arriscou não sabe de todos os buracos do asfalto e não sabe que deslizar por ele também é cair de vez em quando. numa fração de segundo tudo pode mudar. é o risco que te acompanha a todo instante.

atingir o sublime estado de atenção plena ao manter meu corpo máquina numa operação contínua adiante. me faz respirar ar puro. girar. fazer a máquina acelerar. um vício sucessivo.