Sentados no Bar do Matias, com toda essa nossa inquietação,
uma dúvida cruel começou a remoer meu cérebro e fazer meus dentes coçarem:
afinal, há quanto tempo já estávamos sentados ali? Porque pra mim já havíamos ficado
uma vida inteira naquela mesa.
Vacilante, perguntei ao Thiago se ele sabia há quanto tempo.
Mas é claro que não sabia. Àquela altura, duvido que nem seu próprio nome ele não
soubesse mais. Pelo menos do meu nome eu ainda me lembrava. Na verdade o que eu não conseguia discernir direito mais, era a minha idade naquele momento. Porque na minha cabeça já
haviam se passados alguns anos enquanto aquela cerveja esquentava dentro da
garrafa em cima da mesa entre nós.
Então não me contive. Ainda meio relutante, chamei a mulher
do bar que nos atendera antes. Uma negra que parecia ter a idade da minha avó.
Perguntei a ela há quanto tempo eu e meu amigo estávamos sentados ali. Ela riu
meio desconfiada. Mas o caso pra mim era muito sério, repeti a pergunta. Mesmo achando que eu já soubesse a reposta e estivesse debochando
dela, enfim ela
respondeu: “Ué! Vocês acabaram de sentar aí, nem a cerveja tomaram ainda!” Incrédulo,
eu perguntei se ela tinha mesmo certeza daquilo, se não estava se confundindo –
afinal pra mim ela era uma velha muito louca. Na verdade, acho que perguntei
algumas vezes até perceber que eu já estava insistindo demais na questão. Olhei
para o Thiago e ele só me disse: “To doidaço, mas acho que é isso mesmo, já faz
umas horas que estamos aqui”. Cara, não queria mais aquela confusão.
De súbito me levantei, sorri e meu cérebro derreteu suave.
Olhando para as nuvens enfim compreendi. Afinal de contas,
eu já estava bem mais velho e, portanto, com sabedoria suficiente para essa compreensão:
de que o tempo é vivo por si só e tem um poder tremendo de se distorcer. Eu só
estava dançando com ele. E eram os céus que entoavam nossa música, num embalo
quase que eterno. Numa orquestra nota a nota majestosamente frita. Um momento mais do que sublime, surreal.