quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Pensamentos de Rubian (passados num banco da Rua XV e na Praça Osório)

Eu a vi passar novamente. Outra vez não me viu! Não sei, pode ser problema de vista. Sim, é possível. Bom, eu quero acreditar nisso. Mas o que me resta de lucidez me alerta, alegando que estou enganado: ela nunca usara óculos, nem lente. Infelizmente eu lembro disso. “Pra que se enganar supondo um problema de vista? Você vai chegar aonde dessa forma?” Maldita lucidez! Faz minha mente dividir-se em dois. De um lado, a amargura de nunca mais ser enxergado por ela; do outro, uma ponta de esperança de reviver seus olhos. Há um remédio, há um remédio. Não pra mim: para ela. A vista dela certamente está embaçada; ou cansada; ou embriagada! É, com certeza, não me viu por conta de sua embriaguez. Estava bêbada! Mas eu a perdôo. Não quero brigar agora, me sinto cansado. Neste banco vou esperá-la passar outra vez. Ela vai passar. Sempre passa. Sempre embriagada. Sempre míope.
Vou aproveitar esse meu momento de espera, para vaguear por minhas memórias: no parque, sentado ao lado dela. Ouvindo o silêncio da vida. Conversando despreocupado. O sol já indo embora, despedindo-se de nós de uma forma linda, proporcionando-nos uma vista maravilhosa. Ela olhava para o céu avermelhado. Eu esquecia-me do céu. Seu rosto já era meu paraíso: sua boca, seus olhos, sua pele, seu corpo. Eu via apenas ela. Nada mais de pôr do sol. Meu céu vinha junto com seus beijos. Naquele gramado passamos toda a tarde. Era domingo. Ou sábado? Ou era um simples feriado? Que memória a minha! Esqueci-me.
Por quanto tempo já estou aqui? Não vejo mais pedestres. Ela passou de novo? Perdi-me em pensamentos. Como pude! Distrai-me! Distrai-me recordando de bons tempos vividos, “ou foram inventados?”. Minha cabeça dói; latejando, fervendo. Não posso acreditar o quão idiota fui em não vê-la passar outra vez. Devo procurá-la. Não pode ter ido muito longe. Ah, lá está ela. Consigo vê-la andando lá longe. Não posso tropeçar agora, vou correr. Meus pés estão me matando, trabalhei muito hoje. Estou a alcançando. Nunca imaginei que esta praça fosse tão longa. Olho pra seus cabelos balançando. Parece estar correndo também. Estará correndo? Terá acontecido alguma coisa? Acho que tem alguém a seguindo. Quem será? Não há mais ninguém aqui. Qual o motivo do medo dela? Talvez seja pela noite. A lua não nasceu hoje. Há muitas nuvens no céu. Oras, e essa praça! Que iluminação mais precária! “Você está enganado. Ela foge é de você” Não! Odeio esses pensamentos. Quem está no comando aqui sou eu. Ela está fugindo da escuridão, procurando alguma luz. Eu vou atrás dela. Eu já a perdoei, “mesmo?!”. Iremos começar tudo de novo, do zero, “de novo?!”. Ela aceitará, sei que aceitará. Uma nova vida se faz quando refletimos sobre ela mesma. Li isso em algum lugar. Suponho que de algum livro jogado por aí. Eu quero outra vida com Marina. Acho que a alcancei. Posso até ouvir seus passos, sua respiração ofegante. Eu reconheço desde aqui seu perfume. É ela! É ela! ”Inexistente! Inexistente!” Esses cabelos pretos, eu nunca me enganaria. Um preto que, refletido ao sol, torna-se mais lindo ainda. Neste momento está assim, refletindo o sol da manhã. O sol já veio dar o ar de sua graça. Curioso, ontem, a noite estava tão sombria, tão feia. E veja só o dia de hoje: abriu-se encantador. Que dia! Será ótimo restabelecermos nosso amor - “você nunca amou” - nessa manhã tão bela.
Oh não, ela tropeçou. Tenho que ajuda-la. Não agüento mais meus pés, estão doloridos demais. Minha vista já foi melhor também. Está tudo tão embaçado. “Onde está ela agora?!”No geral, minha vida sempre foi confusa. Ela ali caída - ”onde?” - e eu simplesmente apenas a observando, como um animal. Ela não me viu àquela hora. No fundo nunca a perdoei. Posso dizer que minha vista também não me deixou fazer nada: lógico que será uma desculpa, uma mentira. Aliás, ela é uma mentira. Marina é uma mentira.

2 comentários:

Thaís disse...

Imaginei bastante sobre os lugares e os pensamentos de Rubian.

beijos Lui.

Pathy disse...

Isso me lembra aquelas tardes em que eu sonhava acordada, até o telefone tocar...